
A tragédia foi há 60 anos, mas continua viva na memória dos matosinhenses. Dos que se lembram e dos que ouviram vezes sem conta esta história dramática, cujos contornos trágicos foi passando de pais para filhos. Este fim-de-semana, foi tempo de recordar o dramatismo, a dor e a saudade sentidos pelas famílias dos 152 pescadores mortos no naufrágio de 2 de Dezembro de 1947. Foi também tempo de homenagem, com uma deposição de flores no monumento às vítimas do naufrágio, um momento emotivo no qual o Presidente da Câmara, Dr. Guilherme Pinto, fez questão de estar presente.
No sábado, dia 1 de Dezembro, pelas 18 horas, viveram-se momentos de grande emoção com a exibição do documentário evocativo do naufrágio, “Senhor Deus dos Desgraçados”, realizado por Marcos Lourenço que, como ele próprio confessou, ouviu várias vezes o avô contar esta história tão trágica para Matosinhos.
Ontem, pelas 9 horas, celebrou-se, na Igreja do Bom Jesus de Matosinhos, uma missa em memória das vítimas, promovida pela Associação de Pescadores Aposentados de Matosinhos.
Mais tarde, na Capela de Santo Amaro, foi apresentado o livro “Naufrágio de 1947 – Toda a Saudade É Um Cais de Pedra”, da autoria de A. Cunha e Silva e Belmiro Esteves Galego, numa edição conjunta da Câmara Municipal de e da Junta de Freguesia de Matosinhos. Esta obra foi apresentada por Fernando Sá Pereira, presidente da Associação Comercial de Matosinhos e filho duma das vítimas do naufrágio.
Pelas 11 horas, realizou-se, na Praia de Matosinhos, junto ao monumento evocativo do naufrágio, a deposição de flores, num momento em que se destacou a presença, ao largo da Praia de Matosinhos, de embarcações de pesca representantes das comunidades de Matosinhos, Vila do Conde e Póvoa de Varzim.
De tarde, pelas 15 horas, na Casa dos Pescadores de Matosinhos, realizou-se também uma sessão de apresentação do livro “Mulheres do Mar…Mãos de Sal”, editado conjuntamente pela Câmara Municipal e pelo Núcleo de Amigos dos Pescadores de Matosinhos - NAPESMAT, onde são publicados diversos estudos sobre a história e etnografia da comunidade piscatória de Matosinhos.
Existem acontecimentos históricos que, pela sua dimensão trágica, ficam indelevelmente marcados na memória das comunidades, mesmo após várias gerações. O grande naufrágio de 2 de Dezembro de 1947, considerado na altura o maior desastre marítimo de que havia memória na costa portuguesa, foi um desses momentos.
Foi numa funesta madrugada de Dezembro, completaram-se agora sessenta anos, que o trágico desfecho duma noite de tempestade, resultando em mais de centena e meia de pescadores mortos, se tornou conhecido em Matosinhos.
Naquela época, a pesca tinha um peso económico e social muito importante em Matosinhos, que era o primeiro centro pesqueiro do país, com mais de 100 traineiras e onde laboravam directamente alguns milhares de pessoas.
No entanto, os meios disponíveis para as operações de salvamento eram reduzidos e não puderam evitar o naufrágio destas traineiras, nem a morte dos seus ocupantes. Numa localidade onde a pesca era uma das actividades que maior número de pessoas empregava, o efeito desta tragédia foi avassalador, uma vez que quase não houve família em Matosinhos que não fosse atingida por esta tragédia.
O naufrágio de 2 de Dezembro de 1947 foi considerado, na altura, o maior desastre marítimo de que há memória na costa portuguesa. Na tarde de 1 de Dezembro de 1947, saíram para o mar 103 traineiras, rumando para o mar ao largo da Figueira da Foz, onde estavam os cardumes de sardinha.
Apesar de terem saído com bom tempo, a partir do final da tarde as condições meteorológicas alteraram-se rapidamente e os barcos foram apanhados numa tempestade com ventos superiores a 140 km/h e vagas de grandes proporções.
As traineiras que navegavam mais longe da costa conseguiram salvar-se com dificuldade, mas as que se aproximaram mais da costa, por desorientação ou porque os motores não tivessem força suficiente ou avariassem, foram atirados contra as rochas.
Nessa noite (madrugada de 2 de Dezembro), quatro traineiras que tinham saído da barra de Leixões naufragaram no litoral de Gaia, entre o Cabedelo e o Senhor da Pedra. O balanço feito na época apontava para 152 pescadores mortos neste desastre
Este desastre marítimo resultou ainda em 71 mulheres viúvas e 152 crianças orfãs.
Nos dias seguintes, ao longo do litoral de Gaia foram dando gradualmente à costa os corpos dos tripulantes destas traineiras. Isto significou para Matosinhos o prolongamento durante vários dias desta tragédia, com os funerais a sucederem-se diariamente ao longo de muito tempo. Muitos corpos nunca apareceram e doutros apenas restaram algumas partes.
